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Isto também é Pedagogia do Esporte. O caso do bobinho pedagógico.

Duas histórias. Duas formas de enxergar a Pedagogia do Esporte.

Foto de Fernanda Ramirez

Fernanda Ramirez

            Hoje vou falar em nome do basquetebol sobre o que é Pedagogia do Esporte. Poderia contar histórias de futsal; mas pensando bem não faz lá muita diferença uma vez que a pedagogia é, por certo, uma prática transferível, seja do basquete para o futebol e vice-versa ou quaisquer outras modalidades. E quem nunca ouviu falar sobre isso, sobre o “transfert”, procure pelo francês Claude Bayer e seu livro O ensino dos desportos colectivos, porque vale, mesmo, muito à pena. Outros autores também versam sobre o assunto e também valem muito à pena. É como se as histórias que vou contar fossem transferíveis para uma e outra modalidade, principalmente por aquilo que elas representam; isso com certeza!

BOBINHO PEDAGÓGICO

Era um time de basquetebol, com garotas por volta de seus 12 anos. Seria um jogo como outro qualquer, como se um jogo pudesse ser como outro qualquer. De fato, um jogo não pode ser como outro qualquer, mas todo jogo possui um número bastante considerável de situações que, independente de suas particularidades, torna um jogo apenas um jogo. Mas aquele, com certeza, não foi apenas mais um jogo, primeiro porque minhas alunas entraram em quadra de um jeito não habitual, travadas, comprometendo muitas ações técnicas e táticas. Depois, porque era preciso que esta situação fosse revertida; afinal de contas ninguém entra em quadra para perder, na idade que tiver. No intervalo do primeiro para o segundo tempo o placar contava quinze pontos em desvantagem e meu objetivo, nos minutos de intervalo, foi tentar fazer com que, no mínimo, o jogo ficasse um pouco mais equilibrado e fazer também com que minhas alunas recuperassem seus movimentos soltos, oriundos de ações esportivas livres, com significantes próprios, que davam ao grupo certa particularidade. Então nos dirigimos, eu e minhas alunas, ao interior da quadra para uma atividade bem conhecida, o bobinho. Eu também participei. Por que não o faria se somos uma equipe? A brincadeira aconteceu por uns 7 minutos, que foi justamente o tempo que elas demoraram a recuperarem suas alegrias de jogar. Sim, estavam mais livres do que antes e isso era o que importava. Mas algumas pessoas não acharam isso conveniente. Não me acharam com uma atitude de técnico, como se existisse uma atitude de técnico. Como se existisse uma cartilha dizendo o que o técnico deve, ou não, fazer. Vai ver existe. Vai ver técnicos não fazem mais do que decorar planilhas e jogadas ensaiadas. Talvez fosse assim com o técnico da equipe adversária, o primeiro a dizer que minha atitude não era atitude de técnico. Depois foi um pai, que talvez tenha ouvido o que este técnico falou e que por isso se sentiu no direito de também dizer alguma coisa uma vez que pai sempre sabe o que é melhor para seu filho. Eu escutei os argumentos porque não sou surda, mas ignorei. Que outra coisa eu poderia ter feito? O fato é que o segundo tempo foi emocionante. Soltas, minhas alunas jogaram como nunca, acabaram vencendo com uma pequena diferença de quatro pontos e foi uma choradeira sem fim, porque menina, nessa idade, é assim mesmo: chora quando perde e chora quando ganha. Isso porque o esporte exige, sempre, que se estabeleça significado, qualquer que seja ele.

BOLAS PEDAGÓGICAS

            Era o mesmo time de basquetebol, com garotas por volta de seus 12 anos. Seria um dia de treino comum como qualquer outro não fosse uma delas atravessar correndo a quadra gritando que o Joãozinho estava por lá, bem pertinho. Bem do lado de fora do ginásio. Confesso que eu não entendi a mensagem, mas as outras entenderam. Tanto, que me deixaram lá, sozinha, com bolas de basquete pulando sem controle até perderem a força. Bolas que antes estavam em bom controle nas mãos de minhas alunas. Elas exercitavam o drible, porque trabalhar fundamentos nesta idade é sempre uma boa opção. No entanto, mesmo estando eu cheia de boas intenções, elas não foram suficientes para manter a atenção das meninas pela prática esportiva. Muito mais importante foi a visita do Joãozinho, um garoto muito, mas muito especial, além de muito bonito também. Quando eu saí do ginásio para ver de quem se tratava, notei que ele tinha um charme fora do comum, o príncipe encantado que explicava tamanha euforia. Até eu mesma poderia ficar por lá, conversando um pouco mais com o garoto e verificar se ele era mesmo tudo isso quanto fazia parecer, mas não podia. Como professora, tive que tomar uma atitude mais enérgica que, no caso, consistia em fazê-las voltarem para dentro do ginásio, o que não foi tarefa fácil. Mais difícil ainda foi retomar os fundamentos que, como já disse, é sempre uma boa opção. Foi difícil porque elas pararam de respirar basquetebol para respirarem Joãozinho. Voltaram aos fundamentos, mas não os viviam, o que na minha concepção era uma atividade perdida do mesmo modo como as bolas haviam ficado quando a primeira garota atravessou o ginásio anunciando a presença do Joãozinho. Era preciso fazer alguma coisa para que aquele dia fizesse sentido, senão para o basquete, para a vida delas, o que também é muito legal de se pensar já que a maioria dos jovens atletas que praticam alguma modalidade não se tornará profissional. Então sentamos todas, eu e as meninas, para uma conversa sobre o assunto em questão, o Joãozinho e tudo aquilo que poderia envolvê-lo como os beijos, as amizades, as traições, as confidências, enfim, a sexualidade. Basquete? Só uns quarenta minutos depois, para um racha sem qualquer tipo de intervenção, até quando não se estivesse mais a fim. Até quando não se fizesse mais sentido. Isso porque a pedagogia exige, sempre, que se estabeleça significado, qualquer que seja ele.

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